Na última sexta-feira, 30 de agosto de 2013, diversos representantes de todos os elos da cadeia sucroenergética, juntamente com algumas lideranças políticas, estiveram reunidos no Teatro Municipal de Sertãozinho (SP).
O Ato Público de Defesa da Cadeia Produtiva Sucroenergética teve como objetivo debater a falta de políticas públicas e de interlocução mais eficiente entre o indústria sucroenergética e o governo.
Ao final, os representantes elaboraram uma carta, que pede a criação de um marco regulatório do setor, a fim de tentar encerrar uma crise que se estende por cinco anos. O documento, que ainda não tem data para ser entregue ao governo federal, está reproduzido, a seguir, na íntegra:
Ato Público em Defesa da Cadeia Produtiva Sucroenergética
“A cadeia produtiva do setor sucroenergético emprega, diretamente, 2,5 milhões de trabalhadores, reúne cerca de 400 usinas, 80 mil fornecedores de cana e 4 mil indústrias de base, distribuídos em mais de 600 municípios brasileiros, que produzem acima de 5000 hectares de cana por ano, e correm o risco de verem suas economias estagnadas no curto prazo.
A ausência do setor produtivo de açúcar e etanol nos planos estratégicos do governo demonstra a omissão das autoridades federais quanto aos riscos de sobrevivência que o setor está correndo.
As dificuldades não se restringem aos produtores, mas a toda uma cadeia produtiva, que não busca subsídios ou proteção, pelo oposto, somos contrários a eles, especialmente os regionais e pontuais que ao invés de resolver os problemas estruturais, aumentam o preconceito e desmoralizam a comprovada competência do setor, que só contribui para diminuir a competitividade, a eficiência, a produtividade e a inovação tecnológica do setor.
A falta de políticas claras e previsíveis de preços desorganiza o setor que busca saída, ora, produzindo etanol, ora produzindo açúcar, chegando a comprometer o abastecimento dos produtos para atender a demanda. Temos o valor da nossa produção utilizado como instrumento de controle da inflação e atrelado ao preço da gasolina, que penaliza esse setor sucroenergético e toda a sua cadeia produtiva.
Não reivindicamos royalties, subsídios ou sustentação oficial de prejuízos. O que nós precisamos é do respeito das autoridades pelo trabalho de produzir, o cuidado dos agentes econômicos com o valor que agregamos na matriz energética e nas contas nacionais; e do cuidado especial com a saúde e a perspectiva de toda nossa cadeia produtiva, já com enorme comprometimento fiscal e financeiro.
Senão, vejamos:
• 44 usinas deixaram de moer cana nas últimas duas safras. E mais 10 deixarão de moer na próxima safra;
• 100 mil empregos foram extintos no período;
• A desnacionalização ultrapassa 40% do setor;
• As indústrias da cadeia produtiva não têm encomendas e trabalham a 50% da sua capacidade
nominal, enquanto observam a consolidação dos produtores asiáticos;
• Não existem projetos de novas plantas, como demonstra a carteira de consultas do BNDES. Por isto realizamos este ATO PÚBLICO EM DEFESA DO SETOR SUCROENERGÉTICO, com o objetivo de avaliar e propor soluções que atendam emergencialmente as necessidades mínimas de sustentação da cadeia produtiva.
OS PROBLEMAS
Os problemas são conhecidos, e de duas naturezas: Conjunturais e Estruturais, o que requer medidas imediatas e reestruturastes, de maneira planejada. A estrutura do setor se mostra fragilizada e perdeu a oportunidade de se reestruturar durante o período de crescimento econômico dos últimos governos e ainda ficando com seus preços atrelados a gasolina, que tem na sua política de preços o instrumento de controle da inflação, com isto trazendo grandes prejuízos para o setor.
Ainda em 2003, quando da 2ª. reunião da recém-instalada Câmara Setorial do Açúcar e Álcool, registrou se em ata o compromisso de implementar um marco regulatório para o setor, e depois de 12 anos passados, permanecemos ainda esperando por ele, sem iniciativas concretas
Diferentemente da Petrobras, a cadeia produtiva do etanol não tem a mesma capacidade de suportar prejuízos, pois não tem subsídios, nem hedges de negócios ou de políticas públicas. Daí a insustentabilidade do setor e a total inviabilidade de sua continuidade.
A título de informação, o “Valor Econômico” do dia 26/08/2013, publica que, nos dois últimos anos a Petrobras, consumiu todo o seu lucro acumulado na última década. Contabilizou 39,6 bilhões de reais de prejuízo, apenas suportável porque tem um grande portfólio de negócios, garantidos por políticas públicas.
Na conjuntura, temos este quadro agravado pela inflação dos custos de produção, muito maior dentro dos portões da indústria, do que o índice oficial, que é represado artificialmente pelas políticas de controle de preços.
Diante disto, precisamos atacar de forma urgente e organizada com medidas que resolvam os problemas imediatos, conjunturais do setor, possibilitando sua sobrevivência, para então ganhar musculatura, retomar capacidade de investimento, e, num segundo momento, se reestruturar para um crescimento sustentável.
Neste primeiro momento, existe uma demanda emergencial que objetivamente poderia reduzir os prejuízos da produção enquanto se inicia um processo para uma demanda vital, indispensável, que remunere o etanol de forma justa, viabilizando a sustentação definitiva do setor.
A DEMANDA EMERGENCIAL
Estender ao etanol e a cana de açúcar em todo o país os termos e as subvenções descritas na medida provisória 615, relativas ao nordeste brasileiro;
DEMANDA VITAL
Estender ao etanol tratamento isonômico na formação de preços que se dá à gasolina, ou desatrelar seus preços, oferecendo isonomia de mercado aos fornecedores dos dois combustíveis.
Só após o atendimento destas demandas, será possível atacar os problemas estruturais que farão a sustentabilidade do setor a longo prazo. Esta reestruturação do setor deve passar por um processo de retomada planejada e sustentada dos investimentos em novas usinas, hoje estagnadas, sem encomendas, que vai deteriorando a situação econômica de toda a cadeia.
Quanto mais tempo demorarmos para iniciar este processo, mais caro e arriscado será o custo de sua implementação. De acordo com estudos do BNDES, a indústria de máquinas está trabalhando com 50% de ociosidade, e prestes a perder sua capacidade de entregar equipamentos para projetos futuros, aumentando o risco e a incerteza na imobilização de capital.
Este cenário inviabiliza o futuro do etanol no Brasil e sepulta o investimento brasileiro de séculos na tecnologia consolidada do setor, em que o Brasil tem ainda a liderança e prestígio internacional.
Portanto, precisamos de medidas adicionais num futuro próximo, e se tomarmos como referência o mesmo trabalho do BNDES, teríamos que trabalhar, no mínimo, com a perspectiva de construir mais 134 usinas para atender a demanda projetada para 2020, o que requer medidas reestruturastes audaciosas.
AS DEMANDAS REESTRUTURANTES:
- Definição clara da matriz energética quantificando a participação de cada combustível num prazo definido;
- Marco regulatório que valorize os benefícios socioambientais e estratégicos do etanol diante dos riscos do combustível fóssil;
- Leilões públicos de energia independentes por fontes, regionalizados, com valorização dos benefícios da energia limpa;
- Políticas de inovação para competitividade e eficiência da produção nas usinas e nos motores flex;
- Projeção de geração, qualificação e requalificação de 600 mil novos postos de trabalho; 6. Políticas de conteúdo nacional no suprimento de máquinas e equipamentos, preservando a tecnologia e incentivando sua evolução;
- Desoneração fiscal de projetos “Greenfield”, que será compensada com maior arrecadação no futuro.
Estas medidas, de curto e médio prazos só serão possíveis caso haja, além de um compromisso político das autoridades, um acompanhamento diuturno por parte de toda a liderança da cadeia produtiva, com direção executiva, cobrando resultados de maneira direta e disciplinada, e reportando indicadores de resultados a todos os atores da cadeia produtiva. Enfim, administrando a retomada.