Descontinuidade – A falta de um planejamento para a matriz energética, a longo prazo, é a principal reclamação do setor. Nenhum dos governos anteriores, nem mesmo o atual, foi capaz de criar um planejamento coerente. Apesar da defesa constante do etanol, o pré-sal passou a tomar a maior parte das atenções e a receber altas somas de dinheiro, indicando uma involução ao considerar as questões ambientais. Para o professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) e ex-coordenador do Polo Nacional de Biocombustíveis, Edgar Gomes Ferreira de Beauclair, “o próximo governo precisa resgatar a importância dos combustíveis renováveis em vez de ficar alardeando o que ainda não é real e que tem altos riscos ambientais (pré-sal)”. Os investimentos públicos no pré-sal reduziram as somas de dinheiro aplicadas na pesquisa para aprimorar a tecnologia existente e desenvolver, em larga escala, o etanol celulósico, que pode colocar o Brasil à frente, até mesmo dos EUA. “É preciso incentivar investimentos em CT&I (Centro de Tecnologia e Informação) do setor de biocombustíveis e energias renováveis, onde ainda temos uma posição de destaque internacional. Mas com as atenções voltadas ao pré-sal, parece que vivemos a era pós-etanol”, diz o professor Beauclair. Para ele, os “investimentos nos combustíveis de segunda e terceira geração, dependentes do domínio da tecnologia de hidrólise da celulose, podem dar um retorno muito superior que os investimentos em energia hidráulica na região da Amazônia, e com um passivo ambiental infinitamente menor”. A necessidade de pesquisa para alavancar a produção é ainda mais premente, já que as expectativas para exportação nos próximos dez anos são grandes. Espera-se que o país se torne o maior fornecedor mundial do produto, porém, hoje em dia, 75% da produção é usada para abastecer o mercado interno e a demanda continua crescendo. O desafio é aumentar as exportações sem prejudicar o mercado doméstico e sem elevar os preços a ponto de tornar-se o etanol menos atrativo, em termos financeiros, para a população. O presidente da Unica (União da Indústria da Cana-de-açúcar), Marcos Jank, disse durante o Fórum de Energia 2010, promovido pela revista Exame, que “as perspectivas para o setor são muito positivas, mas não estamos vendo um novo ciclo de crescimento ou o surgimento de novas usinas. Em parte, devido à crise financeira do ano passado, mas também pela falta de políticas públicas mais claras”, disse Jank. Aliás, a Unica afirma que é preciso definir um marco regulatório para os biocombustíveis, que garanta a sustentabilidade econômica deste produto. Uma comissão do Senado aprovou, em agosto deste ano, a apresentação de projeto de lei que dispõe sobre a política nacional para os biocombustíveis, que foi o resultado de sete audiências públicas realizadas este ano, coordenadas por um grupo de trabalho designado para elaborar um Marco Regulatório para o setor. Entre as propostas incorporadas ao projeto, está o incentivo a ações nacionais e internacionais de certificação dos biocombustíveis para o reconhecimento da sustentabilidade da produção. A Unica também defende a criação de políticas para o uso do etanol e biocombustíveis no transporte público. Há, atualmente, alguns poucos projetos sendo testados em São Paulo e Curitiba, que já vem apresentando resultados positivos, gerando economia e menos poluição. Para o setor, ainda faltam “linhas de crédito específicas para as usinas viabilizarem os trabalhos de estocagem e ampliação, e para a indústria de bens de capital poder atingir a liderança no mercado internacional”, comenta o diretor presidente do CeiseBR (Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroalcooleiro) e diretor titular da Diretoria Regional do CIESP Sertãozinho, Adézio José Marques.
Infraestrutura – Outro ponto importante, que não é exclusivo do setor sucroenergético, mas uma reivindicação de todos os segmentos, é a melhoria da infraestrutura de logística e a redução do custo do transporte. Os portos nacionais não conseguem dar conta do movimento de navios. Uma prova deste problema é o congestionamento visto nos portos para embarcar açúcar nos últimos meses. Investimentos privados têm colaborado para melhorar a situação, mas ainda não são suficientes. Falta transporte por linhas férreas e hidrovias, que seriam considerados modais baratos. Enquanto isso, o principal meio de transporte é o rodoviário, que além de caro, em sua maioria, oferece péssimas condições. Uma alternativa, que já está em processo de instalação, são os alcooldutos. Porém, o próximo governo precisará aumentar os incentivos a este tipo de transporte e levá-lo às mais diversas regiões do país, o que representará não só uma redução nos custos para importação, mas também no preço do biocombustível em regiões não produtoras. Para a Unica, é necessário prever em lei as regras para a instalação e operações de dutos para transporte de biocombustíveis ou de etanol, com “critérios para a autorização da atividade pela ANP; garantia de exclusividade pelo período de amortização do investimento; regras de garantia de acesso e de compartilhamento de espaço com outros serviços públicos e outras atividades exercidas pelo estado, inclusive por concessionárias”.
O grande desafio – Para o jornalista Ronaldo Knack, o maior desafio que o setor terá com o próximo governo é “destravar, de fato, as amarras que impedem e inviabilizam a cogeração de energia elétrica a partir do bagaço de cana”, visão compartilhada pelo professor da Esalq, Edgar Beauclair, que complementa: “não se pode mais ter uma capacidade instalada como a atual sem uso ou com leilões direcionados.” Knack afirma que, para resolver estes gargalos, é preciso que os usineiros, os fornecedores de cana e de bens de capital do setor atuem politicamente como cadeia produtiva.